A cada ano, a doação de órgãos oferece uma nova chance de vida para milhares de pessoas. Dados do Ministério da Saúde mostram que, apenas no primeiro semestre de 2024, o Brasil bateu um novo recorde ao realizar 14.352 transplantes pelo Sistema Único de Saúde (SUS), superando os 13,9 mil registrados no mesmo período de 2023.
O país tem o maior programa público de transplantes do mundo, mas, apesar de o número de doadores ter dobrado nos últimos 15 anos, o índice está longe do ideal. A cada 14 pessoas que poderiam doar, apenas quatro se tornam doadoras. Como consequência, mais de 43 mil brasileiros seguem na lista de espera por um órgão. Desse total, 28 mil aguardam por um transplante de córnea, conforme o Ministério da Saúde.
Entre os fatores que explicam esse cenário estão o desconhecimento sobre como funciona o processo de doação e os receios infundados que ainda cercam o tema. Diante disso, compreender o que é mito e o que é verdade sobre transplantes e doação de órgãos se torna essencial, tanto para quem está na fila de espera quanto para as famílias que podem, em algum momento, tomar essa decisão.

É possível furar a fila do transplante
Mito. A dúvida costuma surgir com frequência, especialmente quando casos de transplante urgente envolvendo pessoas famosas ganham repercussão. O Sistema Nacional de Transplantes (SNT) esclarece que a fila é única, válida para todo o território nacional e regulada de forma rigorosa, sem distinção entre pacientes da rede pública ou privada.
A ordem dos transplantes é definida por critérios técnicos, como compatibilidade sanguínea, peso, altura e gravidade do quadro de saúde do paciente. Aqueles em estado crítico têm prioridade, o que pode causar a percepção equivocada de que há favorecimento.
Em entrevista à imprensa, o enfermeiro do Departamento de Coordenação em Transplantes da Associação Brasileira de Transplantes (ABTO), Tadeu Thomé, explica que o sistema cruza um conjunto complexo de informações e gera uma lista de quem está apto a receber o órgão, com base em regras estabelecidas em portarias, não havendo espaço para subjetividade.
Qualquer tentativa de comercializar, intermediar ou obter vantagens na doação de órgãos é considerada crime no Brasil, com penas que variam de três a oito anos de reclusão, além de multa, conforme determina a Lei dos Transplantes (lei nº 9.434/1997).
Não é preciso documento formalizado para doar
Verdade. Apesar de existir a possibilidade de registrar formalmente a vontade de ser doador, por meio da Autorização Eletrônica de Doação de Órgãos (AEDO), esta não é uma obrigatoriedade para que a doação aconteça. Na prática, a autorização final depende da família do doador.
Por isso, é fundamental que a pessoa manifeste em vida o desejo de ser doador. Após a confirmação da morte, a equipe médica realiza o acolhimento à família, esclarece dúvidas e conduz o processo.
Família do doador deve arcar com os custos
Mito. O processo relacionado à doação e ao transplante de órgãos no Brasil é integralmente custeado pelo SUS, desde a retirada e o transporte dos órgãos até a realização do transplante.
A rede pública oferece assistência completa e gratuita aos pacientes, incluindo preparação para o dia da cirurgia, exames, procedimentos cirúrgicos, monitoramento e tratamento após o transplante, como informa o Ministério da Saúde.
Apenas órgãos vitais podem ser doados
Mito. Além de órgãos vitais como coração, pulmões, fígado, pâncreas e rins, também podem ser doados tecidos, como córneas, pele, ossos, tendões e válvulas cardíacas, conforme explica a Associação Brasileira dos Centros de Diálise e Transplante (ABCDT).
Outro ponto importante é que, enquanto alguns órgãos precisam ser transplantados em poucas horas após a retirada, tecidos como pele e córneas podem ser preservados por mais tempo, garantindo maior viabilidade na logística da doação
Um único doador pode salvar diversas vidas
Verdade. Um único doador pode beneficiar, no mínimo, dez pessoas, segundo o Ministério da Saúde, tendo em vista que é possível destinar órgãos e tecidos para diferentes receptores.
A doação em vida também é possível em alguns casos, como no transplante de um dos rins, parte do fígado, pulmão ou medula óssea, desde que haja vínculo familiar de até quarto grau.
Doação de órgãos desfigura o corpo
Mito. Esta é outra questão que costuma provocar receio entre as famílias. Contudo, a remoção dos órgãos e tecidos é feita por meio de procedimentos cirúrgicos, com os mesmos cuidados adotados em qualquer cirurgia.
Após a retirada, o corpo é devidamente preparado e pode ser velado normalmente, não interferindo na realização das cerimônias de despedida.
Idade não impede doação
Verdade. Qualquer pessoa pode ser considerada uma potencial doadora, independentemente da idade ou histórico médico. A definição sobre quais órgãos e tecidos podem ser aproveitados ocorre após avaliação clínica, exames laboratoriais e de imagem realizados pela equipe de saúde.
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